Coluna [3]: Faltam controles, não recursos, para o fundo eleitoral

O deputado Cacá Leão (PP-BA) apresentou relatório sobre o Projeto de Lei de Diretrizes Orçamentárias, que delimita o que pode entrar na Lei Orçamentária Anual. Nele, incluiu previsão de ampliar o Fundo Especial de Financiamento de Campanha, conhecido como fundo eleitoral, em cerca de dois bilhões de reais, mais do que dobrando o valor alocado para as eleições de 2018 (de R$ 1,7 bilhão).

O argumento utilizado para a ampliação orçamentária é que as eleições municipais seriam mais caras que as eleições gerais e, portanto, precisariam de mais recursos. Os políticos foram rápidos em lembrar que em geral temos muito mais candidatos nas eleições municipais que nas eleições gerais. De fato, segundo dados do TSE, tivemos 26.085 candidatos aptos concorrendo nas eleições de 2018 e 469.165 candidatos aptos nas eleições de 2016 – quase 18 vezes mais candidatos.

Por outro lado, o gasto nas eleições municipais por candidato sempre foi muito menor que nas eleições gerais, pois o número de votos que eles precisam conquistar é bem mais baixo – um vereador de uma cidade pequena é eleito com menos de mil votos em muitos casos. Assim, embora as eleições municipais tenham mais candidatos, não é necessário gastar muito mais dinheiro nas eleições municipais que nas gerais.

Além disso, os limites de gastos introduzidos em 2016 reduziram os gastos das eleições municipais em 71%, totalizando R$ 2,2 bilhões (valores de 2016), de acordo com dados do TSE. Se lembrarmos que apenas as doações privadas de pessoas físicas totalizaram R$ 2,5 bilhões em 2016 (apenas no primeiro turno), verificamos que se repetíssemos o fundo eleitoral de 2018 mais as doações privadas das últimas eleições municipais, já teríamos muito mais recursos em 2020 que em 2016.

Portanto, não temos evidência de que seja de fato necessário ampliar o valor do fundo partidário, a despeito dos argumentos dos políticos. O que realmente precisamos discutir, porém, é quais os controles que teremos sobre a utilização desses recursos.

Laranjas prejudicam a representatividade

Em 2016, apenas 13% dos candidatos e candidatas ao cargo de prefeito eram mulheres. Entre os eleitos, este número é de 11,6% – um pouco menor que o percentual de candidatas, portanto. Regulamentação do TSE determinou que os recursos do fundo eleitoral devem obrigatoriamente destinar 30% do fundo para mulheres. No caso das eleições de 2018, aumentamos a participação feminina no Congresso de 10% para 15%. Conforme artigo publicado no Poder360 que eu e Juliana Sakai, nossa diretora de operações, escrevemos em 08 de março deste ano, as candidatas laranjas dificultaram que tivéssemos maior representação feminina na política.

Assim, deveríamos discutir na verdade a criação de mecanismos mais efetivos de controle das candidaturas laranjas e dos gastos de campanha. Deve ser evitado, por exemplo, que os recursos para mulheres sejam empregados na prática para homens. Podem ser criados tipos criminais específicos para isso, bem como regras de transparência para prestadores de serviço, atos de campanha e mais transparência sobre a utilização dos recursos do fundo eleitoral pelos candidatos.

A impunidade impede o controle dos gastos de campanha 

Outro problema é a impunidade. Do lado da Justiça Eleitoral, o TSE ainda não terminou julgamento sobre o primeiro caso das candidatas laranjas, algo importante para nortear as decisões dos tribunais eleitorais regionais.

Do lado do Legislativo, o Congresso trabalhou para garantir impunidade. A Lei 13.831/2019 anistiou multas aplicadas pela Receita Federal aos partidos políticos por não investirem o mínimo de 5% do fundo eleitoral para promoção e difusão das participação política de mulheres. A Transparência Brasil chegou a assinar uma nota conjunta com outras organizações contra essa anistia, mas o efeito foi limitado e a anistia foi aprovada.

Assim, se o Congresso quer aprovar novamente recursos públicos para as campanhas políticas, deve se comprometer com mais transparência e regras mais rígidas de punição por seu descumprimento. Além disso, uma emenda constitucional deveria ser aprovada, proibindo anistia futura.

Como se vê, há poucas restrições e controles sobre o uso de recursos públicos, e quando as penalidades chegam, são anistiadas. As contas partidárias, que devem ser julgadas pelo TSE, acontecem com muita lentidão e, na prática, são mais uma fonte de impunidade.

Assim, a discussão sobre ampliação ou não dos recursos públicos deve, obrigatoriamente, estar atrelada à definição de seus limites, a como será feito seu controle e ao estabelecimento de punição severa para quem descumprir estes limites. Um Congresso que aprova anistia a multas por descumprimento da legislação sinaliza que não está comprometido com o uso responsável dos recursos públicos. E sem esse uso responsável, nem possibilidade efetiva de controle, não podemos confiar que a ampliação dos recursos será positiva.

 

Manoel Galdino
Diretor-executivo da Transparência Brasil